Se o mundo vai acabar, por que deveríamos reagir?: a agenda da educação ambiental no limiar do colapso ambiental
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O livro de Philippe Pomier Layrargues e Michèle Sato revela um claro sentido de opor-tunidade no contexto policrítico e preocupante que vivemos. Os fatos cotidianos e os alertas científicos têm demonstrado, a pelo menos cinquenta anos, desde o relatório “Limites do Crescimento”, os riscos crescentes implicados em nosso modelo civilizatório (Meadows, 1973).
Em seu roteiro, os autores mobilizam uma diversidade de pesquisadores, nacionais e internacionais, das várias áreas implicadas no debate sobre o colapso socioambiental para iden-tificar os movimentos sociais, as percepções, as disputas e controvérsias sobre o tema. Assim, nos deparamos na leitura com a sociologia de risco de Ulrich Beck, os limites do crescimento de Meadows, a colapsologia de Pablo Servigne e Raphaël Stevens, o decrescimento de Georgescu-Roegen e Serge Latouche, a acumulação por despossessão de David Harvey, as fronteiras planetárias de Joham Rockström e parceiros, o antropoceno de Paul Crutzen, o capitaloceno de Jason Moore, o saber poder de Michel Foucault, o princípio de responsabilidade de Hans Jonas, a ecologia profunda de Arne Naess, a pedagogia da indignação de Paulo Freire, os aparelhos ideológicos de Louis Althusser, o tempo das catástrofes de Isabelle Stengers, a desobediência civil de Henry Thoreau, a teoria de Gaia de James Lovelock, entre tantos outros autores e recortes analíticos que tecem o fio narrativo dos autores.
O livro, nesse sentido, faz uma reflexão crítica e realista sobre as promessas do desen-volvimento sustentável lançadas em 1987 pelo Relatório Brundtland, para mostrar que a proposta fracassou em cumprir os objetivos declarados de justiça social, preservação ambiental e da biodiversidade, cooperação entre países do norte e sul, segurança alimentar, resposta às necessidades do presente e das gerações futuras (Brundtland, 1987). E, como era previsível, a proposta não se mostrou viável porque se fundamentava numa lógica capitalista onde a economia é a prioridade hegemônica, onde a lucratividade e a competitividade dos investi-mentos são imperativos incontestáveis, onde a natureza e seus bens não são objetos para a satisfação das necessidades humanas, mas recursos mercantis para a valorização do capital. Nessa racionalidade não são possíveis projetos de justiça e distribuição da riqueza, princípios de solidariedade e cooperação, cuidados de proteção ambiental nem práticas de participação e de cidadania para todos (Lima, 2017). O discurso do desenvolvimento sustentável, na verdade, foi uma resposta substitutiva ao esgotamento da proposta de desenvolvimento econômico que, desde o pós II Guerra, prometia a superação da pobreza, da fome e das desigualdades sociais entre os povos e nações. Nunca realizou esse intento porque o crescimento gerado se concentrava nas mãos das elites agrárias, industriais e financeiras, quando deveria se distribuir entre todos os cidadãos, não apenas na forma de renda e salário, mas de educação, saúde, moradia, acesso à cultura e a um ambiente digno e saudável.
Em sua reflexão sobre o desenvolvimento sustentável, os autores abrem um impor-tante parêntesis para estender sua crítica aos proclamados Objetivos do desenvolvimento sustentável – ODS, lançados em 2015 pelas Nações Unidas como uma ambiciosa agenda mundial para fazer avançar até 2030 a implementação da proposta formulada pelo Relatório Brundtland em 1987. São 17 ODS e 169 metas que vão do combate à fome e a erra-dicação da pobreza à proteção dos ecossistemas e contenção da crise climática passando por problemas de gênero, de energia limpa e de manutenção da paz (Gil, 2017/18). Os ODS têm sido bastante divulgados e fazem parte de um grande número de iniciativas educacionais, sociais, políticas e culturais em todo o mundo. No entanto, sofre dos mesmos problemas da proposta de desenvolvimento sustentável onde, talvez, o principal seja sua inviabili-dade em uma sociedade centrada na racionalidade econômica, no crescimento ilimitado e na acumulação contínua de capital. Como, nesse contexto econômico-político, é possível erradicar a pobreza? Conservar a biodiversidade? Combater a crise climática? Trata-se, portanto, de uma carta de boas intenções, repleta de contradições, que promove objetivos e metas inalcançáveis com intuito de demonstrar que existe alguma solução à vista quando, na verdade, elas não existem no presente status quo.
Ao final da reflexão, os autores dialogam com a educação ambiental para indagar que contribuições ela pode oferecer nesse cenário de desafios extremos. Poderíamos com eles perguntar: qual a agenda da educação ambiental no limiar do colapso?
Referência: LAYLARGUES, Philippe Pomier. Se o mundo vai acabar, por que deveríamos reagir? [recurso eletrônico] : a agenda da educação ambiental no limiar do colapso ambiental / Philippe Pomier Layrargues, MichèleSato. – Brasília : Editora Universidade de Brasília, 2024.